Compliance em Angola: Sinais Legislativos de Alerta e Conformidade Obrigatória

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O compliance, na sua essência, é o mais óbvio dos comportamentos. Agir em conformidade, fazer o correcto, faz parte do nosso ser. Neste sentido, o compliance (ou a sua falta) é o simples e óbvio resultado das nossas atitudes, dos nossos comportamentos e das nossas escolhas. Partindo deste pressuposto óbvio, pode-se, também, se concluir que a necessidade do compliance acompanha a existência de qualquer sociedade. Onde existe sociedade existe, necessariamente, o Direito, a Ética e, consequentemente, um comportamento em conformidade com os mesmos.

O Direito, para além da sua função legitimadora de actos humanos, tem um papel importante na persuasão sobre as nossas escolhas, influenciando comportamentos e tomadas de decisões através de imposições e sinais legislativos. Os sinais legislativos funcionam, assim, tal como os sinais de trânsitos, como orientadores da nossa caminhada, com proibições, permissões e, sobretudo, alertas de perigo.

A vontade de quem decide, e influencia, pode ser analisada nestes pequenos sinais que nos ajudam a prever o cenário que se avizinha. Em Angola, a visão clara de transmitir confiança aos investidores (nacionais e estrangeiros) tem sido evidenciada numa profunda alteração e modernização legislativa que iniciou em 2018. Diplomas estruturantes do sistema jurídico têm dado especial relevância ao compliance e à governação corporativa.

Vejamos alguns destes sinais que servem de alerta e necessidade clara de termos compliance obrigatório nas empresas angolanas:

– A Lei de Bases do Sector Empresarial Público (Lei n.º 11/13, de 3 de setembro) estabelece, no artigo 17.º, que as empresas públicas ou com domínio público devem adoptar procedimentos de controlo interno;

– A Lei dos Contratos Públicos (Lei n.º 41/20, de 23 de dezembro) impõe, no seu artigo 4.º, às empresas que participem nos concursos, a obrigação de observância dos princípios e regras do governo societário;

– A Autoridade Reguladora da Concorrência, ao abrigo da sua competência de difundir orientações que considere relevantes (artigo 6.º d) do Decreto Presidencial 313/18, de 21 de dezembro), emitiu o Guia de Compliance Concorrencial, reconhecendo a necessidade de Compliance como instrumento fundamental de cumprimento da Lei da Concorrência (Lei n.º 5/18, de 10 de maio) e da prevenção das sanções previstas nos artigos 21.º a 25.º da referida Lei;

– A Lei de Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais, do Financiamento ao Terrorismo e da Proliferação de Armas de Destruição em Massa (Lei 5/20, de 27 de janeiro) tem um âmbito de aplicação subjectivo muito alargado, abrangendo os prestadores de serviços e empresas que exercem comércio em geral. No âmbito das medidas de combate ao branqueamento de capitais, as instituições abrangidas devem implementar sistemas de controlo de conformidade (artigo 22.º 1.º a);

– O Novo Código Penal Angolano (Lei n.º 38/20, de 11 de novembro) alterou profundamente a tipificação dos crimes no sistema angolano, dando especial relevância aos crimes contra o mercado e a economia (artigo 453.º a 473.º), tipificando os crimes de corrupção ao sector privado (artigos 459.º e 460.º) e corrupção no domínio do comércio internacional (artigo 461.º). Com a entrada em vigor do Novo Código Penal, as empresas, seus gerentes e administradores, passaram a ter, ainda mais, motivos para uma preocupação diária com o compliance.

Um outro sinal claro foi dado recentemente com a aprovação do novo Regime das Instituições Financeiras através da Lei n.º 14/21, de 19 de maio. O artigo 71.º institucionaliza o Código do Governo das Instituições Financeiras Bancárias que foi regulado pelo Aviso do Banco Nacional de Angola n.º 10/21, de 14 de julho.

Vale a pena aqui transcrever o conteúdo do artigo 7.º que poderá, num futuro próximo, constar na Lei das Sociedades Comerciais. De acordo com este artigo: “As instituições devem definir, implementar e, periodicamente, rever o seu modelo de Governança Corporativa, pelo menos uma vez por ano, contemplando a estrutura de capital, a estratégia de negócio, as políticas e processos de gestão de risco, as unidades e estruturas orgânicas e as políticas aplicadas, designadamente: a) A política de remuneração; b) A política de controlo interno; c) A política de compliance; d) A política de transacções com partes relacionadas e a prevenção de conflitos de interesses; e) A Política de transparência e divulgação de informação; f) O Código de conduta; e g) O Canal de denúncias.”

O Aviso clarifica, ainda, alguns conceitos teóricos, com relevância prática, que podem ser utilizados como referências em todas as áreas do mercado angolano. A política de compliance é entendida como “o documento com directrizes, cujo objectivo é garantir a conformidade com os princípios éticos e os requisitos legais e regulamentares, nacionais e internacionais, que regem, directa ou indirectamente, toda a actividade da Instituição”.

Entre os vários riscos referidos no Aviso, destacamos o risco de reputação (“percepção adversa da imagem das Instituições por parte dos clientes, contrapartes, accionistas, investidores, supervisores e opinião pública em geral).

Realçamos ainda, o artigo 5.º a), frisando que a “cultura organizacional da Instituição deve observar os elevados princípios éticos e integridade, consubstanciados em códigos de conduta em políticas que identifiquem e mitiguem os conflitos de interesses”.

Temos, portanto, claros sinais legislativos com princípios e normas que obrigam a olhar para o compliance como necessário e como instrumento obrigatório para o cumprimento do quadro legal.

Não há dúvida de que uma das formas mais eficientes de se estar em conformidade é ter um programa efectivo de compliance. Partindo da dimensão, dos desafios e dos riscos da empresa pode-se utilizar, como referência, o modelo instituído para as Instituições Financeiras Bancárias para a implementação do modelo adequado do compliance à medida dos riscos empresariais.

Compliance obriga-nos, constantemente, a melhorar o que está bem e a corrigir o que está mal. Os sinais legislativos podem ser os nossos melhores amigos, pois, quem avisa amigo é!

*João Dono

Doutorando em Direito / NOVA School of Law

Colaborador do NOVA Compliance Lab